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DESPEDIDAS

Por Soraya Nour Sckell

A palestra do Luís sobre o "cosmopolitismo de Schiller" foi feita  no dia 15 de junho de 2022. Três dias depois ele nos deixou. Nossa amizade começou em 1993, no nosso primeiro semestre do curso de Filosofia na USP. Há trinta anos atrás, o jovem Luís já tinha a sensibilidade apurada, a cultura sofisticada e o estilo literário elegante que todos hoje reconhecem no brilhante filósofo que ele se tornou. Mas além disso, Luís tinha já também uma reflexão crítica impiedosa que, combinada a um humor muito fino e a um caráter gentil expressava-se em charges, canções e paródias absolutamente geniais de todos os autores que estudávamos, mas sobretudo de nós mesmos. Eram obras de arte. E eram tão inteligentes, surpreendentes e engraçadas, ríamos tanto, que tudo que queríamos era estar juntos. Multiplicavam-se assim os grupos de estudo, as conversas filosóficas, que com o Luís tornavam-se, para além de extremamente produtivas, muito agradáveis e divertidas. Isso criou amizades muito profundas, que nasceram naquela época e que duram até hoje para muitos dentre nós. O Luís chamava suas obras de arte de "brincadeiras", e dizia que essas "brincadeiras" eram "homenagens", nas quais uma "peculiaridade" de cada um de nós era o tema. Todo mundo queria ser o alvo da brincadeira, ou seja, todo mundo queria ser homenageado pelo Luís. Prestem muita atenção no vídeo da palestra do Luís sobre o cosmopolitismo na "Educação Estética do Homem", de Friedrich Schiller (na seção "vídeos" deste site). O Luís aqui diz que a obra de arte verdadeira é aquela que transforma em belo a peculiaridade do outro - e que é um "dever" a obra de arte máxima que é a construção de si próprio, um si capaz de ver o belo no que o outro tem de próprio. O "génio" é o que consegue transformar em beleza a peculiaridade de cada um, mas qualquer ser humano também deve conseguir ver o belo no outro, em todos os outros, de qualquer parte do mundo, diz o Luís, e por isso a educação estética do homem é cosmopolita. Ainda, diz o Luís, essa construção da obra de arte é uma "brincadeira": "A brincadeira é séria" , diz ele. Meu mundo sem o Luís ficou muito triste, sem graça, sem brincadeira, sem beleza. O Luís sempre me fez rir demais. Mas ele também sempre me fez pensar demais. Espero que a mensagem que o Luís nos deixa neste vídeo seja tão importante para quem o veja como é para mim. Meus pensamentos e sentimentos neste momento são todos para a Carol, o Joaquim, a Edna e o Carlos. 

Soraya Nour Sckell

Por Fernando Costa Mattos.

Luís e eu tivemos uma amizade bastante intensa durante certo tempo, no início dos anos 2000. Tínhamos muitos projetos em comum, inclusive uma leitura do "Bruno", de Schelling, que fazíamos em seu "escritório" à época, na edícula da casa de sua avó. Depois, nossos caminhos acabaram por separar-se um tanto. Continuamos amigos, é claro, mas nos víamos com menos frequência. Com o passar dos anos, a distância aumentou – eu no ABC, ele em São Carlos, cada um estudando temas diferentes. Mas era sempre bom reencontrá-lo e botar o papo em dia (ou apenas parte dele, infelizmente). Na pandemia, em modo remoto, voltamos a nos falar com certa frequência. Ele participou do meu HH Filosófico, eu participei, a convite dele, de um evento da UFSCar, e nos reencontramos em alguns outros desses encontros online.

Ao saber ontem do seu falecimento, tão precoce e inesperado, dou-me conta, de maneira abrupta, do quanto eu gostaria de ter retomado um diálogo mais frequente com ele – no fundo, creio, eu contava com essa possibilidade futura. Seja como for, e como já o disseram vários outros colegas em depoimentos anteriores, também eu posso testemunhar, pensando sobretudo naqueles anos de amizade próxima, o quanto Luís era generoso e entusiasmado, genuinamente entusiasmado, com os projetos e ideias dos amigos. Ele foi uma das poucas pessoas a quem confiei a leitura do romance que escrevi na época, bem como de outros experimentos literários, e o seu retorno, embora pertinentemente crítico em muitos pontos, tinha essa marca da generosidade, de alguém que quer ver a continuação daquilo em que estamos envolvidos, daquilo que nos dá prazer e nos faz sonhar. O exato oposto dessas figuras, tão comuns em nossa área, que dão risada e dizem: "desista disso". Não, Luís não queria que desistíssemos, como ele mesmo, aliás, jamais desistiu: construiu o seu caminho acadêmico com calma, com persistência e, sobretudo, com independência intelectual – coisa de que muitos abrem mão, como sabemos, para ter oportunidades melhores aqui ou ali. Ele se manteve sempre fiel ao que era, como cidadão de Osasco, proprietário de um velho Fusca (que, salvo engano, havia sido de seu avô) e, na filosofia, iluminista ao seu modo, sem ceder a modismos ou pressões de qualquer natureza. Que o seu exemplo nos ilumine (sem perdão pelo trocadilho, pois era o tipo da coisa de que ele gostava!) no exercício da reflexão filosófica brasileira. E que o seu exemplo como pessoa siga a iluminar a Carol, o Joaquim e todos que tiveram o privilégio de conviver com ele.

Saudades daqueles velhos bons tempos, meu querido amigo, e, sobretudo, da possibilidade de tê-los de volta!

Fernando Costa Mattos

Por Tessa Moura Lacerda

Entramos na Faculdade no mesmo ano, 1993; e já no primeiro semestre nos juntamos para estudar em grupo - queríamos pensar a Filosofia no Brasil. Desse desejo nasceu o "Doxas broteias" - expressão que significa "opinião dos mortais" (que encontramos num dos textos do Osvaldo Porchat) e que deu nome ao nosso grupo de estudos, logo apelidado de Doxas. Reuniamo-nos semanalmente, primeiro, para organizar um evento gigantesco em que reuniríamos os maiores intelectuais brasileiros, depois para estudar Antônio Cândido, Roberto Schwartz, Paulo Arantes, sob orientação deste último. Desnecessário dizer que o evento mega jamais aconteceu, mas o que se teceu ali naqueles encontros, na USP ou na Vila Buarque, no prédio da Maria Antônia, foi uma profunda amizade. O Doxas, antes numeroso, conservou seus 4 membros mais fiéis, Luís, Soraya, Maurício e eu.

Éramos inseparáveis. Estudávamos juntos, fazíamos curso de francês juntos, passeávamos... Amizade, confidência, convivência...

Nossos caminhos se separaram no final da graduação. Mas jamais esqueci aqueles anos de formação juntos e aquela profunda amizade que nos uniu.

A vida é um sopro. Hoje soube que Luís partiu. E dói.

Adeus, amigo.

Tessa Moura Lacerda 

[Também pela ANPOF]

Por Rosa Gabriella

O Luís merece um texto bem feito e acabado . Mas agora isso não é possível. Acabamos de perder um de nossos amigos mais brilhantes e queridos.

Filho único, assim como Maria Lúcia Cacciola, Pedro Gallé, Márcio Sattin, eu mesma, dentre outros que nem sei, Luís foi um dos melhores amigos por saber que os amigos são os irmãos que a gente sente pela alma.

De cursos de graduação, de pós, mesas de Congresso e de bar, debates filosóficos ou de dor de cotovelo, um dos meus amigos mais queridos e brilhantes partiu. Foi o coração dele, talvez grande demais para esse mundo.

A dor é enorme e a vida vai ficar muito mais sem graça sem o nosso querido Luis.

Vivemos juntos cursos de graduação e de pós, seminários e grupos de estudo. Ansiedades para mostrar o trabalho para o orientador e, ao mesmo tempo, nos divertindo e criando laços de amizade tão fortes.

Hoje uma parte da minha vida morreu, e nunca alguém poderia substituir todo o afeto e admiração que sinto pelo meu querido Luís Nascimento.

Rosa Gabriella

Por Daniel Tourinho Peres

Todo o dia tentando compreender o incompreensível, como que em suspenso, sem chão. Um amigo tão doce, tão jovem, tão sensível e inteligente, cheio de espírito. Impossível, não dá. Tantas noites e tantos porres ele aguentou. Luís era puro brilho, até em sua melancolia. Vai, meu amigo.

Daniel Tourinho Peres

Por Homero Santiago

Tirei o dia para mexer numa pasta velha cuja etiqueta traz por título "alter idem". A livre associação do não-sentido em estado puro me fez recordar que durante alguns anos mantive com Luís Nascimento a troca de poesias, estorietas e desenhos (isso, só ele, pois minha mão não é capaz). Abaixo alguns exemplos dele. Nessa pasta reencontrei até um esboço de "O mais antigo programa da platitude brasileira". Um pastiche engraçado, por causa dele, evidentemente, de um texto que lemos juntos numa sentada no prédio da História. As brigas e risadas vinha para identificar quem era quem na redação do texto. Era uma forma de dizer como os anos noventa (após a década perdida) eram chatos pra caramba.

Uma achega do comentário acima, que talvez tenha ficado enigmático num ponto. Brigar para ver que era quem significa o seguinte. NInguém queria ser Schelling, que nos parecia carola demais. Hegel era grandiloquente e incompreensível. Hölderlin era quem sobrava. Mas só o Luís podia fazer esse papel. Um "gênio" no sentido mesmo da Crítica do Juízo.

Para mim, Luís Nascimento sempre foi Luís Petit. Dele falar, agora, é muito difícil. Mas não quero deixar de fazê-lo em sua casa, nosso departamento.

Entramos na filosofia da USP juntos, em 93; fizemos graduação, mestrado e doutorado em concomitância. Participamos juntos da reconstrução do CAF que estava acabado, tocamos uma gestão de ano e meio juntos e conseguimos, entre outras coisas, editar um boletim cafiano em que Luís sempre ocupava a última página com suas charges maravilhosas (faz algum tempo Maurício Keinert, outro amigo daquela gestão, me repassou pdf desses boletins e ora vejo o traço de Luís nesses arquivos).

Para mim, não foi somente um amigo. Foi o amigo. Em nossos tempos de graduação, eu me esforçava com o TIE de Espinosa enquanto ele estudava o parágrafo 51 da Crítica do Juízo. Fizemos isso juntos, lemos muitas coisas juntos, e até hoje o que sei (se é que sei algo) de Kant vem dali.

E me permito relembrar ainda que na revista Dissenso editada em 97/98, não me recordo o momento exato, eu lhe dediquei o primeiro texto que publiquei na vida, com uma frase de Cícero em que se dizia mais ou menos: amicus alter idem est. Ou seja, naquele momento tanto nos frequentávamos, tanto conversávamos, que eu sentia isso mesmo que Cícero dizia de um amigo: carne e osso, unha e dedo.

Quando o Oliver me contou o ocorrido, tive aquela sensação tremenda, horrenda, em que num segundo o passado cai sobre a cabeça dizendo tudo, assim como dizendo nada. A contingência, o fado, a pequena artimanha do destino que fulmina (por isso fala-se em ataque fulminante) sem explicações.

Nos encontramos pela última vez antes da pandemia na História. Tomamos um café. Ele estava com o seu filho; falamos sobre a paternidade. Dizer que estou triste seria como dizer que respiro. O óbvio. O parágrafo 51 da Crítica da Juízo nunca esquecerá o seu mais afincado leitor. Assim como não esquecerei meu amigo.

Homero Santiago

Por Luciana Pudenzi

Foi uma tristeza saber hoje da morte de um amigo, uma pessoa tão querida que se foi muito cedo e muito de repente.

É impossível pensar no anos em que fizemos parte do Grupo de Estudos de Filosofia Alemã sem pensar no Luís Nascimento. Foi uma convivência tão próxima e tão cotidiana: nos seminários semanais do grupo, nas discussões coletivas do andamento dos projetos de cada membro individualmente, nas preparações de edições da revista, nas viradas de noites no bar depois de TODOS os encontros do grupo. As fotos são de uma das confraternizações que fazíamos semestralmente - esta, em especial, foi no sítio do avô do Luís [ver na seção "fotos" deste site]. Um encontro delicioso, com uma enorme sintonia.

Perdemos uma pessoa inteligente e afetuosa, uma presença que podia ter um sentimento profundo e melancólico e ao mesmo tempo transmitir uma alegria incrível (suas paródias musicais são inesquecíveis).

Querido Luís, fiquei triste em saber que a possibilidade do encontro não existe mais. Obrigada pelo carinho sempre.

Luciana Pudenzi

Por Catarina Dutilh Novaes 

Estou muito triste e chocada com a notícia da morte de Luís Fernandes dos Santos Nascimento. 

Lembro dele sobretudo pela irreverência e criatividade: sempre ‘compondo’ músicas, desenhando, inventando estórias. Era também muito ‘original’ em certas escolhas: dirigia seu fusca preto com muito orgulho! (Li um depoimento aqui no Facebook contando que ele continuava dirigindo um fusca!). Penso muito também na sua companheira Carol, a qual não conheci, e no filho deles, Joaquim; que tragédia inaceitável…. Sua morte não faz sentido…

Catarina Dutilh Novaes

Por André Carone

A partida repentina do Luís Nascimento é uma dessas notícias que deixam a gente sem saber o que pensar ou dizer. Desde o começo da noite eu procuro aqui por alguém que me diga que isso não é verdade, porque na minha cabeça isso não pode ser verdade.

Fomos colegas de graduação na USP, nos anos noventa, e mais adiante nos reencontramos em São Carlos: ele já era professor e eu estava encerrando a minha tese de doutorado na UFSCar.

Sempre tivemos muitas coisas em comum, afinidades que permaneceram no meio do caminho. Apesar da distância, agradeço ao meu amigo por tantas coisas que ele me trouxe.

André Carone

Por Taísa Palhares

Nós éramos aquele tipo de grupo que estudava junto, discutia, sonhava com o futuro e se divertia muito. Foram anos e anos de convivência e afeto. Lembro particularmente de um semestre que passamos as tardes de sábado na sua casa preparando os textos cabulosos que estudaríamos nas aulas de Márcio Suzuki sobre Romantismo alemão durante a semana. Depois de fritar a cabeça, a cerveja e os comes eram no antigo Riviera. Com Luís, o riso e a música eram sempre garantidos. Depois de nos perdermos por anos, no início de 2022 nos reencontramos num grupo de estudos, é claro! E eu fiquei muito feliz com esse novo encontro. Vá em paz, querido Luís "Petit" Nascimento.

Taísa Palhares

Por Denilson Cordeiro

Viva, Luís Nascimento!

Toda morte repentina acaba matando um pouco de quem sobrevive. E nunca conseguimos dizer ou escrever com o rigor e a justiça necessários que merece a pessoa que partiu. Hoje morreu Luís Fernandes do Nascimento, um colega da graduação e pós-graduação com o qual estudei durante os anos 90 no Departamento de Filosofia da FFLCH-USP. Luís, como todos e todas que conviveram como ele reconheciam e confirmam agora, era de uma rara inteligência e sensibilidade, acompanhadas por um bom humor sempre disponível, cheio de gracejos, alegria, simpatia e cordialidade. Luís era sorridente e sociável onde a sisudez e o ensimesmamento prevaleciam.

Tenho lembrança dele me dizendo, à porta do centro acadêmico, que estava empenhado em escrever algo, um poema disse, sobre a ideia sonora e sugestiva para ele de “liquidação de liquidificadores”, dizia isso, esperava um pouco e caia na gargalhada logo em seguida. Ele era boa-praça, afetuoso, dedicado e praticava isso com a tamanha naturalidade que nos tornava a cada um e cada uma melhores, porque contagiados por essas virtudes, quando estávamos perto dele.

Luís tinha jeito de menino, cara de bom moço, comportamento de estudioso, agilidade de pesquisador cuidadoso, competência de historiador da filosofia e, não duvido, deve ter sido admirável professor. Frequentava, até onde eu soube, Immanuel Kant como autor de sua escolha e preferência, e esmiuçava determinadas passagens, fielmente revisitadas, da Crítica do Juízo, apreendendo o sistema do filósofo e, imagino, tornando brasileiro o pensamento dele a seus alunos e alunas na Ufscar à maneira do ensaísmo que praticava com destreza, tanto na escrita quanto na fala.

Luís era nascimento, e porque jamais tivesse qualquer parte com a morte, nosso choque foi e é ainda maior. Prova a mais do bom coração que o caracterizava talvez seja que esse mesmo coração talvez partido e quem sabe magoado de padecer com a constatação do grau das iniquidades no mundo, de saber seu país tão marcado por injustiças e misérias, farto de viver na pele a luta pela sobrevivência da educação e da universidade pública, alvos de tão sistemáticos e severos ataques e destruição, tenha protestado seu tanto, duramente, e, mantendo-se coerente até o fim, tenha reafirmado seus limites de tolerância e dado um basta, lançando-se em sacrifício contra tantas injúrias e desaforos, como combatente que avança e não se poupa por nada.

Tenho certeza de que por essas características, Luís agora, se pudesse, estaria nos consolando sobre a dor que sentimos com a sua partida tão repentina, tão prematura, tão injusta. A lembrança dos vários bons e divertidos momentos compartilhados será a forma de prolongar a sua presença, de manter a memória viva sobre a vida como ele a concebia e exercia, com alegria, envolvimento e entusiasmo. E ele ficaria tímido, enrubescido talvez, como era do seu temperamento, com o que pudermos lembrar e dizer acerca do quanto nos inspirava, kantianamente, de verdadeiro, de belo e de justo. Viva, saudoso Luís Nascimento!

Denilson Cordeiro

Por João Pedro Junqueira Andrello

Ao Luís Nascimento, mentor, professor e amigo

A gentileza predisposta:

“Por favor, poderia encostar a porta ?”

“Me desculpe, te interrompi, prossiga,

Precisamos te ouvir, participa,

Não tenha medo.”

E então adejava aladas em nosso peito

As vontades da fala,

Enquanto ele nos ouvia, por detrás dos óculos,

Paciente, atento, guardando segredo;

Nos fazia, não sem encanto, perseverar

Nas nossas alusões mais despropositadas,

Quase alucinadas.

E o nome, o nome sempre indagava:

“O teu nome agora eu acertei,

Ou me confundi ?,

Ah! sim, da próxima vez não errarei”

“Fale um pouquinho mais alto, por gentileza,

Sou meio surdo”… Não sei se pretexto,

Mas surdos agora estamos nós, sem a sua voz,

Sem a sua candura, sem o seus nomes, seus esquecimentos, suas imagens, seus exemplos,  seus cuidados…

O verbo vazio diante do seu infinito silêncio…

Silêncio, que não seja nada,

Pois vão-se multiplicando os racontos e as estórias da tua estada.

Infinita multiplicação, inútil dizer.


A memória,

No turbilhonar a difusão das tuas aparições,

Canta ela mesma um canto para mim.

E vem muita coisa dessas incursões,

Uma lírica fecunda permeia a tragédia,

Tão profunda que já os anos próximos se cansam,

 (O quinto ato estava ainda longe longe longe)

Porque você os preencherá na vida que deixa, e te deixa estar.

Te obriga estar, vida pela qual se enamorou

— Vida tanta de quem incessantemente o seu ofício amou,


O Belo,

Fazia-o da tua tão humana boca

Entre Ele e nós um elo,

Ao menos de aspiração…


O Belo nunca o soube, nem o saberia, nem quisera sabê-lo,

Pois também adivinhava a advertência de Poeta:

“Ai de quem nas coisas transitórias quer colhê-lo!”

Mas não podia ser de outro modo, se só são coisas as transitórias,

E por isso estava sempre em trânsito a sua história,

Nos seus livros, nos filmes, na música, nas ruas, nos bares…

Mas nada de urgência — tudo se passava suavemente.

Quem sabe não lhe viria ao encontro Ele, o Belo em presença,

Numa esquina, Ele e sua ciência,

Parado, à frente do seu fusca ?

Não sei da sua busca,

Mas sei sua paciência.


Bem, só posso imaginar, agora com licença,


Prepararem o festim nos céus os Deuses,

E nós, sem chão, com nossos “adeuses”

E lamentações,

Raiva de mistério,

De desaparição.

Cerra-se o cortinado

Mal se insinuava o melhor ato…


E a cadência tua tão própria  da explanação minudente

(Vai agora saber se algum deus a entende)

Cadência de gentileza, cadência de livres cursos, de delicado declive de rio

em transcurso,

Que se foi abruptamente, árido, sem despedir, num rasgo doído de frio

Que atravessa nossas vestes até o osso, essa vestimenta sutil,

Não o rútilo manto que nos agasalhava pelas aulas

E afastava a especulação vazia com a palavra

— Uma centelha,

Trazendo-nos à beira da fogueira

Cujo brilho era a tua arte,

E as artes a forma instável e fascinante desse fogo,

Que você nos ia indicando,

Mais no calor do afeto, em sala de aula, que nas distâncias noturnas, janelas afora,    

por onde o vento da vida leva-as embora.


Vou divagando, me perdendo,


Divididos, nós ficamos,

Gostaria de mais uns conselhos, mais uns anos

Das tuas palavras e do teu renovado ânimo…

Quem sabe, neste salto, o Belo já não se tenha apresentado,

Sujeito simples de pés descalços, mas pronto para recebê-lo no teu seio,

Já sem as conturbação do corpo e os anseios…

Agora, se divagava, sonho. Mas  em sua companhia,

E é triste não haver mais propósito nesta fantasia.

Queria apenas te escrever,

Tornar mais evidente ,

Te fazer perceber

Que para mim você era a rara força motriz,

E, ora prosaico na lágrima,

Sou só quem te diz: 

Fará muita falta, Luís!

João Pedro Junqueira Andrello


Por Márcio Satin

Para o Luís Nascimento (1973-2022), o melhor anfitrião dos encontros descritos abaixo.

Eu me lembro – quem não? – de montar uma banda nos tempos da faculdade. A nossa tinha por slogans “A primeira banda de rock progressista da história” e “A terceira melhor banda do Departamento”, epíteto que teve de ser mudado para “A quarta melhor...” depois que outros amigos montaram a deles. Como ninguém sabia tocar instrumento algum (eu sei, isso nunca impediu qualquer banda antes), a nossa tinha uma formação, hã, peculiar: oito vocalistas e um cara que sabia dois acordes no violão, apenas um a menos que a média nacional apontada pelo IBGE. O repertório, de covers, claro, incluía “Vou me afundar na lingerie”, do Arnaldo Baptista, uma versão a capella de “Monoquíni”, do Roberto Carlos (depois substituída por uma versão em alemão da mesma música), “El justiciero”, dos Mutantes, com pretensões pré-Mercosul de união dos povos latinos, e “Pierrot Lunaire”, do Schoenberg, numa tocada meio partido alto, meio samba de roda. Como sempre acontece em situações assim, a banda se dissolveu antes do estrelato por divergências artísticas, uns defendendo o comercialismo deslavado do Schoenberg, outros a integridade impoluta do Moço de Cachoeiro. Além disso, houve disputas também na hora das primeiras fotos: quem iria ficar na frente, como seria o pôster de divulgação, essas coisas. Foi uma pena. Não para a música brasileira, é evidente. Mas as jovens tardes, noites e altas madrugadas de sábado ficaram sensivelmente menos divertidas.

[...]

De volta à inaceitável partida do Luís Nascimento. Li vários depoimentos, todos muito bons, que destacam suas virtudes entremeadas a relatos pessoais.

Tenho também muitas histórias divertidíssimas com ele, mas queria deixar registrada em pixel apenas uma delas. Depois de uns bons 10, 12 anos afastado da Filosofia, recebi um convite surpreendente para falar de uma pesquisa que havia recém-começado, sobre as ligações entre filosofia e cinema, numa ANPOF em Curitiba (2012? 2013?), dentro de um ciclo de palestras à noite, na Cinemateca da cidade.

Só havia ido a uma ANPOF na vida, e mesmo assim em esquema bate-e-volta, não lembro o ano, talvez 1999. Fiquei assustadíssimo com o tamanho em que a coisa havia se transformado. Em vários saguões e guichês lotados, fichas e mais fichas a serem preenchidas ( "-Você é key note speaker?" "-O que diabos é isso?", etc), junto a milhares de palestrantes e ouvintes em tudo quanto é canto da cidade, tive o doce auxílio de vários pessoas: Vinícius Figueiredo, o autor do convite descabido, Marcos Nobre, Daniel Peres, Julia Maia e outras tantas que não se resumem a uma vírgula.

"Pavor" é palavra excelente para descrever minha reentrada no mundo acadêmico. Sala cheia e apenas 3 rostos conhecidos na platéia. Luís era um deles. Criei uma luz de spot imaginária em cima do trio e escureci o restante. A cada passo de hesitação na palestra, olhava pro Luís, por exemplo, e via sua cabeça subir e abaixar em sinal de aprovação. Em meio ao ruído ambiente do local, conseguia ouvir nitidamente as vozes deles, dele em particular, rindo de alguma tentativa minha de fazer frase chistosa.

"Apoio" é outra palavra excelente. Ele estava ali naquela noite para me apoiar, assim como esteve em outra ocasião, dez anos antes, em que me encontrava igualmente apavorado: na foto abaixo, ele e a Carol, em 2002, foram visitar meu filho recém-nascido e tranquilizar um pai de primeira viagem. Se não sou um completo fracasso na academia e na paternidade, devo isso em boa parte a você, Luís.

Márcio Satin

Por Pedro Paulo Pimenta

A morte prematura de Luís F. S. do Nascimento priva a filosofia brasileira de um pesquisador talentoso de visões originais, um professor admirado e querido por alunos e orientandos, mas, acima de tudo, um colega que, além de afetuoso, tinha um senso de humor que beirava a genialidade. Desde a graduação na USP, passando pelo mestrado e pelo doutorado, até os anos como docente na UFSCar, Luís teve amigas e amigos em profusão, com os quais gostava de compartilhar essa aliança, para ele tão natural, entre o espírito ágil e a especulação filosófica. Dedicou-se com elegância ao estudo de filósofos como Kant, Diderot e Rousseau. Na conferência inaugural do ano letivo de 2022, em seu Departamento, falou sobre Schiller, autor que conheceu, na década de 90, pelas mãos de Márcio Suzuki. Outro de seus mestres – Laurent Jaffro – o acompanhou numa imersão profunda na obra de Shaftesbury. Escrevendo este obituário, começo a dar-me conta da falta que ele fará.

Pedro Paulo Pimenta

[Pelo Departamento de Filosofia da USP]

Por Cristiana Cardachevski

No fundo sou alguém que ainda se sente estranho, estranha parte do tempo e hóspede de si mesma. Da minha perspectiva, solipsista por excelência, posto que desconstruir se tornou mister desde que meu pai se foi há nove anos. Para fugir da dor, passei compulsoriamente a olhar para fora. Mas volto a narrar que a minha perspectiva é de ter tido o primeiro mês do inverno bem distinto do que poderia esperar.

Até aniversariar, no Bloomsday e no feriado de Corpus Christi, chegara a brincar em pensamentos que meu inverno astral tinha sido quase uma leve primavera. Logo após, no entanto, uma avalanche pareceu me soterrar, quase num afogamento diário de pânico silencioso, praticamente indizível, inenarrável, sentimentos amassados no fundo do armário, traças saindo e dando seus ares de passado puído, de retalhos, me fizeram uma exumação constante. Numa semana foi-se uma enxurrada de acontecimentos. Fui me tornando uma legítima panela de pressão cuja válvula parecia entupida. No fundo sempre soube ter uma dificuldade considerável de transparecer o que sinto, principalmente se colocada em xeque, na tradução em livres discursos falados. Sempre me senti mais à vontade escrevendo que falando. O pensamento em mim leva um tempo para assentar, como poeira em clima seco, em dia quente. Preciso sempre de um aconselhamento da coruja de Minerva. E me culpo como sempre, nas dez-culpas atávicas, por precisar de tempo e nunca ou quase nunca conseguir processar o momento como talvez o tempo do sistema exija. O inferno astral foi a posteriori enfim.

Caminho vendo fantasmas, fantasmas de gente viva e desaparecida, fantasmas de gente que se foi, lembranças exumadas constantemente e diversos tempos que convivem ao mesmo tempo. No âmago da questão, sempre esperei que houvesse espaço para o mágico, esotérico, místico que se embaralhavam desde a infância. Os contos de fada dos Grimm, misturados aos ovos pintados em festas de páscoa que minha avó Moskaliuk trazia junto de uma hóstia da igreja ortodoxa. Anna Moskaliuk nunca foi ortodoxo, mas misturou tudo numa narrativa que chegou a mim com profunda admiração e espanto, sem pai e sem mãe, ou melhor, o pai era um soldado grego que em campanha na Romênia teve algo com minha bisavó que jamais conheci nem por retrato. Ela adolescente, deixou minha avó com a irmã casada e essa menina, minha avó, era tratada como cidadã de segunda classe pela família, irmã/prima, exceto seu tio, pai de criação, que parece ter sido muito amável e muito amado por ela. Fugiram das terras de Drácula, sempre carreguei todas referências no meu imaginário, vieram ao Brasil e aqui ela foi para o colégio Batista, onde limpava para estudar, cantava e tocava violão. Depois foi tentando a vida, detetive, enfermeira no hospital alemão e voraz leitora e autodidata, poliglota, até sânscrito foi buscar para suas aventuras teológicas e teosóficas. Cresci então entre as artes, ciências, numa inspiração romântica de dezenove, onde a educação estética seria o caminho para a sensibilização do espírito e mediante esse despertar, o sujeito poderia efetivamente olhar para o mundo e para si numa relação de autonomia e alteridade, um ente político de fato e em busca de deixar alguma contribuição para a humanidade, ainda que quase invisível, que fosse pelas virtudes, pelo amor.

Acreditei muito no amor, passei a abdicar do amor romântico em nome do amor incondicional como escolha racional, mas não fui fraca, tentei e lutei sim, por todos os poucos amores românticos que tive. Hoje me vejo diariamente pensando em quem se foi, várias vezes por dia. Lembrando a voz, o sorriso, o jeito de olhar, o jeito de caminhar. Tento não pensar tanto, mas transformar num diálogo mental, quase uma oração. Pois confesso ainda trazer aquela cesta de variedades que me constituiu em identidade. Passei parte da vida oscilando entre crer ou não crer. Crer silenciosamente que haja uma continuidade é algo muito pessoal. Não sou de falar muito disso para outrem, pois não professo crenças, nem pratico. Tento praticar a minha bússola, difícil, mas para mim um caminho ou processo de vida, o conhecimento e as virtudes, sem esperar ou mostrar, algo tímido mesmo. Penso de um jeito em quem se foi, de tal modo que seja acolhido e não sofra pela partida, por saudades dos que ficaram. Hoje fui fazer uma entrevista, me dei conta que era o local era próximo da casa dele. Lembro de uma vez ter ido com ele e Soraya. Pensei que talvez para quem parte seja mais difícil do que quem fica. Quem fica ainda pode falar e ser escutado, pode rezar missas e outras coisas. Quem vai não tem essa facilidade, na sua fluidez, na sua transparência, desejo que não se sinta solitário. Pedi que papai fosse olhar por ele, conversar, acalmar o coração e mandar lembranças se possível. 

Daquele universo sem palavras, da nossa pré-história, há algo que marcou o campo dos afetos e diz respeito ao silêncio, a não ser escutada, a me sentir desamparada, a uma percepção de antes de tudo sermos sós.  Fui para minha mãe, me senti amada por ela e pela irmãe Miriam, na troca, no circuito dos afetos, fui me acalmando, mostrei para elas a foto dele, o vídeo do último Colóquio, o site. 

Um dos meus medos mais antigos é o de perder as pessoas que amo. Tenho lembranças vívidas aos 6 anos, medo de perder meu pai e minha mãe, notava que eram mais velhos que os pais dos coleguinhas. Aprendi a viver cercada e embrenhada nas diferenças. Escutar e tentar me comunicar na inexorável incomensurabilidade que sempre resta entre nós. Enfim, escrever um pouco é uma tentativa de sobreviver e também de manter acesa alguma crença ou esperança, lutar em nome do amor pelo humano, demasiado humano, meu, teu, nosso, deles, de todos sobretudo. Um grito de sanidade para dizer que sinto, que tenho um coração, pelo amor que sinto ainda. Acho que sempre soube que meu coração é meu ponto fraco e forte, sinto tudo pelo coração, e é tudo tão intenso dentro de mim, que metaforicamente ou literalmente afetam o corpo físico, somatizo nesse órgão de choque. Por isso passo tempos reclusa para me refazer em minha concha, por necessidade de sanidade. Para racionalizar e elaborar o meu lado pouco domesticado, sensível demais.


Carrego todas as pessoas no coração. E nem sempre isso faz bem. Pesa e faz sofrer.

Mas o Luís eu faço questão de carregar com todo carinho e com a esperança que um dia eu reencontre todas pessoas amadas que partiram. Desejo que se de fato há algo além, que ele esteja ou fique bem e reconstrua caminhos e descobertas e não sofra de saudades dos seus, que seja agraciado por uma espécie de esclarecimento transcendental místico em que veja a vida de um modo epifânico e apoteótico, cheia de Graças e inspiração. Que haja sabedoria e amplitude e paz no coração. Que descanse em paz para recarregar as baterias para outras investigações, outras histórias e outros reencontros. Esteja bem, querido Luís. Seu filho, esposa e pais um dia saberão de ti. É o que eu sempre continuei a crer, ainda que subterraneamente na minha caminhada nesses últimos espaços e tempos. Foi racional, foi mais forte que eu, foi demasiado humano, seguindo e tornando-nos quem somos. Luz".

22/07/2022  

Cristiana Cardachevski

Por Lili Pontinta

A importante missão de ensinar. 

Em 2010, entrei na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) para estudar Filosofia. Tive logo no primeiro semestre Introdução à Filosofia, cadeira leccionada pelo Professor Luís Nascimento. Estudámos o Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens, de Jean-Jacques Rousseau. Foi a partir das suas aulas que me apaixonei pelo pensamento político de Rousseau e decidi estudá-lo.

Luís Nascimento escolheu ser Professor. Não sei se ele chegou a pensar que poderia ser um canal de divulgação do conhecimento filosófico para partes do mundo que ele não chegou a conhecer. Talvez não tenha pensado que daria aula a uma africana, guineense, que, um dia, voltaria ao seu país para aderir também a nobre profissão: Professor.

Luís contribuiu tanto para o meu crescimento académico como humano. Ele não chegava apenas para dar as aulas. Conversava comigo e me dava orientações, indicava leituras, fazia questionamentos, etc. Isso contribuiu significativamente para o meu amadurecimento académico. O contributo que hoje estou a dar em Guiné-Bissau teve uma participação significativa do Professor Luís.

É uma pena estar a escrever isso depois de já não estar conosco. Sempre quis manifestar o que estou a escrever agora, mas pensei em fazê-lo presencialmente, ou seja, quando voltar ao Brasil, o país onde fui muito bem acolhida e ajudada em todos os sentidos. Infelizmente, aconteceu a tragédia. No entanto, gostaria de dizer à Professora Ana Carolina, ao pequeno Joaquim, aos seus familiares e amigos que o Professor Luís deixou um enorme contributo não só para São Carlos, São Paulo e o Brasil, mas também para a outra banda do Atlântico.

O Professor Luís foi cedo demais e de forma repentina, mas ajudou a semear o conhecimento através da nobre missão do Professor. Luís Fernandes dos Santos Nascimento, seu legado há de permanecer vivo para sempre.

Escrevo este texto no dia em que minha tese de doutoramento recebeu Menção Honrosa do Prêmio Capes – Edição 2022 (11/08/2022), querendo com isso expressar minha eterna gratidão a esse Professor que contribuiu significativamente para o êxito da minha tese.

Lili Pontinta 

Laurent Jaffro

Quand nous rencontrions quelque contrariété, une aspérité du quotidien qui nous contraignait de changer un peu nos plans, une déception sans gravité, Luís disait dans son français idiosyncrasique : 

“Tout est d’accord.” Il disait aussi parfois dans le même sens : “Tout est parfait.” 

Comme tous les produits de l’imagination, ces expressions ont un fondement réel. C’est la manière dont Luís retrouvait dans une autre langue le “tudo bem” qui ponctue le moindre échange. En français, nous disons ordinairement “d’accord” ou “parfait” par pure politesse, et ces formules sont presque vides. Elles ne l’étaient pas dans sa bouche qui présentait alors souvent un sourire mi-figue mi-raisin.  

Non, Luís, tout n’est pas parfait.  

Tout n’est pas d’accord.  

Je m’aperçois que parmi mes amis les plus chers, vivants et morts, il y a une catégorie de personnes qui, sans être chinoises, ne m’ont jamais dit “non”, toujours “oui” ou “peut-être”. Cela peut être énervant dans une discussion philosophique, où on s’attend à affronter des objections, où on se risque à des propositions qui peuvent mériter le refus.  

La chinoiserie qui consiste à ne jamais dire “non” caractérise une espèce de philosophes qui préfèrent la conversation à la discussion, le concert à l’argumentation. Tout est d’accord. 

Pourquoi le stéréotype de la politesse chinoise me vient-il à l’esprit ? C’est que Luís aimait les stéréotypes nationaux comme des objets d’un amusement dont il n’était pas dupe. Les généralités sont des fictions, mais parfois des fictions qui nous divertissent des douleurs de la singularité. Presque tout ce que je sais des Argentins, c’est grâce aux généralités de Luís. Il faut avouer que je n’ai vraiment connu que trois Argentins, et deux d’entre eux confirmaient le stéréotype.  

J’ai toujours trouvé Luís délicieusement singulier y compris dans son goût des généralités. Il était capable d’un degré extraordinaire de sensibilité et d’empathie, qui allait bien au-delà de ce que semblent exiger la morale et l’expérience esthétique. Mais il mettait sa singularité au compte d’une humeur générale brésilienne (je crois que c’était une pudeur de sa part, qu’au fond c’est complètement faux, et désormais la vieille bossa me dégoûte, et je ne veux plus entendre parler de la saudade, et de toute cette psychologie touristique, au moins tout le temps du deuil pour l’ami “si cher et si délicieux” – ces mots ne sont pas les miens mais ceux d’un vieil homme qui au printemps saluait ainsi la mort de mon père). 

Sa singularité, en philosophie, dans son style philosophique, tenait à une combinaison, une intrication de subtilité et de simplicité. Généralement, les philosophes subtils ne sont pas simples, mais sophistiqués (le mot n’est pas un compliment). 

Je voudrais dire tout cela de manière plus concrète, et en relisant le philosophe dont Luís et moi sommes des disciples, Shaftesbury. Je devrais parler de la simplicité à partir de Shaftesbury, et d’autres qualités comme le naturel, et aussi de thèmes comme l’importance morale de la famille et de l’amour entre les parents. Je pourrais transformer tout cela en longue glose et même en faire une conférence didactique. 

Ce que je ne pourrai plus dire, sinon comme une parole dans le vide, c’est 

“Oi, Luís” 

C’est ce que j’aimais le plus à dire, à celui qu’on croise au coin d’une rue ou en passant une porte, 

Ce qu’aujourd’hui encore et toujours je voudrais dire, 

Mais la rue est presque déserte et la porte ouvre sur l’infini. 

L’infini est-il sans personne ? 

Dans le poème d’Álvaro de Campos, il faut le salut d’Esteve et il faut pouvoir saluer Esteve depuis la fenêtre pour que l’univers se reconstruise autour de soi sans idéal ni espoir. 

Faut-il renvoyer l’idéal au pays des idées en le priant de ne pas revenir, car il fait du mal à ceux qui l’aiment trop ? 

Je ne sais pas, car sans l’idéal le monde ne serait pas seulement privé de la mélancolie, mais aussi de l’humour et de beaucoup d’autres choses très importantes 

mais je suis certain qu’il faut garder l’espérance à la maison. 

Oi, Carol.  

Oi, Joaquim. 

Laurent Jaffro

UNIFESP

Com imenso pesar, recebemos a notícia do falecimento do Prof. Dr. Luis Nascimento (UFSCar), no dia 19 de junho.

Um dos mais brilhantes estudantes de sua geração, no curso de Filosofia da USP, onde realizou seus estudos pós-graduados de mestrado, doutorado e pós-doutorado, com pesquisas na Johannes Gutenberg Universität e Université Paris1 Sorbonne deixa um legado de textos e pesquisas sobre Kant, Diderot e Rousseau. O jovem que amava a filosofia, a literatura e o teatro exerceu forte influência junto aos colegas, alunos e todos aqueles que estiveram ao seu redor.

Expressamos nossos mais sinceros sentimentos e solidarizamo-nos com seus familiares, amigos e colegas, desejando o conforto possível neste momento.

Departamento de Filosofia da UNIFESP

UFSCar

Sob impacto, profunda tristeza e consternação, o Departamento de Filosofia informa o falecimento do nosso querido Luís Fernandes dos Santos Nascimento. Por respeito, o prédio não será aberto e não será realizada nenhuma atividade acadêmica nesta semana que entra, inclusive, aulas de graduação para o Curso de Filosofia e para os outros cursos. As atividades serão retomadas na segunda-feira, dia 27/06.

Departamento de Filosofia da UFSCar

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©2022, by Fã-Clube do Luís

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